21 janeiro 2010

E isso é pra ser bolsa, ou cassino?

*Uma questão de milésimos*


* *

A bolsa de valores brasileira está próxima de se tornar um pregão de alta velocidade -- onde cinco operações de compra ou venda são feitas num piscar de olhos

Por Eduardo Salgado

No começo de 2010, a bolsa de valores brasileira deve entrar para o grupo dos pregões mais velozes do mundo. Assim que a Comissão de Valores Mobiliários, o órgão que faz o papel de xerife do mercado de capitais, der sua aprovação, gestores de recursos poderão colocar seus servidores a poucos metros do computador central da bolsa que processa os pedidos de compra e venda. Com isso, terão condições de fazer negócios em prazos de 10 milésimos de segundo -- será possível fechar cinco operações num período de tempo equivalente a um piscar de olhos. Hoje, os gestores de fundos conhecidos como "de alta frequência" colocam seus servidores dentro de corretoras e, na melhor das hipóteses, fazem uma operação em cerca de 40 milésimos de segundo. "As maiores bolsas do mundo já alugam um espaço próximo ao seu computador porque há muitos investidores interessados em lucrar com minúsculas diferenças de preço. Chegar antes vale dinheiro", diz Edemir Pinto, presidente da BM&F Bovespa.

Essa alucinada corrida contra o tempo diz muito sobre o funcionamento do mercado financeiro -- no mundo e, cada vez mais, no Brasil. Nele, o conceito de velocidade vem sendo sistematicamente redefinido. Para fazer um bom negócio é preciso fazê-lo antes de qualquer outro. Esperar por algumas dezenas de milésimos de segundo para concluir uma transação é esperar uma eternidade para algumas categorias de investidores. O principal motivo dessa mudança foi o crescimento dos fundos que usam softwares para analisar a trajetória de ações, títulos e moedas e que disparam automaticamente ordens de compra e venda. A lógica da maioria deles é completamente diferente da do investidor comum. Eles não querem comprar uma ação e ficar com ela por meses ou anos. A estratégia dos aplicadores de alta frequência é aproveitar distorções momentâneas de preço de papéis e índices para comprá-los quando estão baratos e vendê-los com lucro. Isso tudo num ritmo tresloucado, várias vezes por dia.

Com poder de análise e velocidade sobre-humana, as máquinas brigam entre si para ver qual consegue identificar uma oportunidade de ganho mais rapidamente. Mas o que tudo isso significa para o investidor comum? Para quem aplica em ações pensando no longo prazo, os efeitos são positivos.
Diz Daniel Mendonça de Barros, sócio na corretora Link, de São Paulo:
"Como compram e vendem continuamente, esses fundos dão mais liquidez ao mercado -- há compradores e vendedores para as ações mesmo em momentos de grande nervosismo nos pregões". Para os investidores que operam várias vezes ao dia -- os day traders, na expressão em inglês usada no Brasil --, as consequências são diferentes. Como tanto eles quanto os gestores de alta frequência buscam a mesma coisa -- aproveitar distorções momentâneas no preço das ações --, os day traders se tornam competidores da segunda divisão quando confrontados com o novo aparato tecnológico. "Um ser humano com a mesma estratégia de um software vai perder sempre. É o arco e flecha contra a metralhadora", diz Raphael Juan, executivo responsável por produtos da CMA, uma das líderes em softwares de negociação eletrônica no mercado financeiro brasileiro.

Nos Estados Unidos e na Europa, as novas armas de fogo do mercado financeiro são motivo de polêmica. Para alguns políticos britânicos, os softwares teriam subvertido a lógica do mercado de capitais ao transformar os pregões em videogame. Na visão desses críticos, os investidores de bolsa deveriam cumprir apenas o papel de provedores de capital para as empresas. Na mão contrária, os defensores dos softwares argumentam que eles são importantes porque, como exploram as distorções do mercado, tendem a diminuir a volatilidade dos pregões. Se uma ação está caindo demais sem justificativa, eles compram -- prática que muitas vezes suaviza as quedas. Outra questão levantada contra os gestores de alta frequência é a da competição desleal. Nos Estados Unidos, parte deles paga uma tarifa para ter acesso antecipado às ordens de compra e venda de outros investidores -- o que permite ajustar as estratégias de acordo com o mercado. Os executivos da BM&F Bovespa dizem que aqui essa prática é proibida e que não haverá privilégio.

No Brasil, o segmento dos fundos com softwares ainda é incipiente -- estima-se que não chegue a duas dezenas. Na bolsa de futuros, em que desde junho é possível alugar um espaço ao lado do computador central e fazer operações em 10 milésimos de segundo, os investidores de alta frequência respondem por 6% do volume diário. Nos Estados Unidos, o percentual é superior a 50%. Na Europa, é 35%. "A entrada da bolsa de valores brasileira no clube da alta velocidade deve tornar o mercado local mais parecido com o americano e o europeu", diz Cícero Vieira, diretor de operações e de tecnologia da informação da BM&F Bovespa. A expectativa é que, em três anos, os investidores de alta frequência respondam por 30% do mercado local. Para quem estiver interessado em operar com uma metralhadora nas mãos, um aviso: o desenvolvimento de um software competitivo custa mais de 2 milhões de reais. E economizar nesse quesito pode ser mortal. "Não adianta disputar uma prova de Fórmula 1 num Chevette", diz Marcos Duarte, sócio da gestora Polo Capital, do Rio de Janeiro.

2 comentários:

NC-AQ disse...

KKKKK, você sabe meu, só não acredita.

Como disse, precisa apenas ver a coisa por cima e não fazer parte dela.

Braço.

NC-AQ

Anônimo disse...

Futuro eu não sei.Passado?É uma coisa que ja existia antes de eu nascer.

Miguel 5 anos
Achei fantastico!